domingo, 17 de janeiro de 2010

Vida é argumento

Escreve e diz o que tu queres, há de ser tudo da lei. Desde que você argumente, é claro!

Uma das coisas que entendi, tão logo minha mente assumiu o adjetivo inquieta, é que vida é argumento. Quando somos criancinhas, espíritos por corrigir, aprendemos que argumento é sinônimo de cinto, chinelo, cabo de vassoura e, para os mais antigos, vara de marmelo. Eu explico. O filho diz ao pai: “pai, hoje vou nadar com meus amigos lá na represa!”. O pai raspa a garganta, engrossa a voz e diz: “de jeito nenhum!”. O filho questiona: “por que não, pai?”. O pai “retruca”: “porque não!” É assim uma, duas, três vezes, até que o pai perde a paciência e põe em ação o cinto, o chinelo etc., estes sim “argumentos” irrefutáveis.

Mas onde quero chegar? Acontece que não somos criancinhas a vida inteira. Chega um momento em que os instrumentos de repressão não são mais cabíveis, um momento em que devemos explicações, em que o “porque não” já não resolve. Se antes nossos pais nos impediam de ir nadar com os amigos lançando mão de “instrumentos repressores”, agora, enquanto pessoas maduras, produtoras de textos de toda ordem (vida é texto), é preciso explicar, apresentar e defender ideias, opiniões, pontos de vista, teses. No lugar do cinto, do chinelo, do cabo de vassoura e da vara de marmelo estão agora nosso grau de conhecimento, de discernimento, nossa capacidade de expor com clareza e objetividade o nosso pensamento, nossa capacidade de transformar textos, de pegar discursos de terceiros e utilizá-los como matéria-prima para nossos próprios discursos - intertextualidade. Quer coisa mais linda que isso? Infelizmente o sistema de ensino no Brasil não nos tem dado a chance de viver tal experiência.